A
minha irmã Beth tinha um timing excelente, e um sentido de humor ainda melhor. Bem sabia que aquela cena, eu e o James deitados num fardo de palha não dava a
melhor das ideias a quem nos visse. Mas estávamos de facto só a conversar, a
minha irmã é que tinha o terrível hábito de ver coisas onde não existiam,
ou simplesmente adorava envergonhar as pessoas, tal como o Richard.
- Estávamos
só a conversar Beth. – Confirmei.
- A
conversar…já ouvi chamar de muita coisa, mas conversar…nunca tinha ouvido.
-
Beth, por amor de Deus, achas que toda a gente é tão perversa como tu? –
Respondi á letra.
Ela
ficou chocada com aquela insinuação, só por uns segundos. Ela sabia que era
verdade, e sabia que eu sabia que ela pensava assim. Ela praticamente sonhava
acordada com o Richard. Por trás de toda a aparência inocente que ela tinha, havia uma mente muito sem vergonha. Ela acabou por ir embora e deixou-nos em paz.
Levantei-me
e o James ficou sentado a bocejar. Assim que me ergui senti uma enorme vontade
de me espreguiçar e foi o que fiz. Ele fixou os olhos em mim, não com um
simples olhar, mas com um olhar de um homem que via algo que gostava. Não fingi
não reparar, gostava de o deixar embaraçado:
- Apreciando a vista? – Perguntei descaradamente.
- Tenho
olhos na cara Belle, esperas que os feche? – Disse descontraído e
atrevidamente.
Não
consegui evitar soltar uma gargalhada. Ele não estava a ser dissimulado,
admitiu que estava a olhar para mim, o que me agradou.
- É
justo, acho eu. – Gozei – Ontem á noite vi-te quase sem roupa, estamos quites.
-
Não podes chamar a isso estar quites… - Insinuando que não me tinha visto quase sem roupa.
-
Bem, de qualquer das maneiras está a fazer-se tarde, espero dormir esta noite.
- Eu
também, e tenho fome. Hoje estou definitivamente cansado…andei o dia todo
preocupado com uma certa rapariga que resolveu desaparecer, vá-se lá entender.
Sorri-lhe
apenas, não argumentei porque sabia que era verdade. Fomos á cozinha e eu
preparei algo para nós os dois. A fome era tanta que comemos em silêncio, ou
então era demasiado constrangedor. Admito que por vezes quando estava perto do
James, ficava sem assunto, como que envergonhada, isso não era normal para mim.
Olhar para ele e imaginá-lo como meu futuro marido deixava-me nervosa, intimidada
e cheia de calor. Comecei uma conversa, o ambiente estava a deixar-me
desconfortável:
- O
meu pai e o teu ultimamente andam muito estranhos. Passam horas a
confidenciar…sabes o que se passa? – Perguntei-lhe.
Ficou
relutante em responder, mas acabou por ceder:
- Acho
que estão preocupados com uma possível guerra. As coisas estão a tomar proporções
críticas. – Confirmou as minhas suspeitas.
Há
anos que havia uma disputa entre o rei e o seu irmão mais novo pelo trono de
Stormhold, e sempre houvera um clima de paz efémera, pois tudo estava bem mas
de um momento para o outro isso podia mudar. Uma guerra só traria desgraça. Tanto o meu pai como o Lord Hastings eram amigos de longa
data do rei, desde os tempos de juventude, e se o rei lhes pedisse, eles
juntar-se-iam á batalha. Não havia pensamento mais aterrorizador.
- Criticas?
Porquê?
-
Sabes porquê, se houver guerra todos os homens capazes de lutar serão chamados,
isto está a causar uma grande inquietação entre os aliados…
-
Sim, eu sei, só espero que não chegue a isso.
- Sinceramente, eu
também. – Confessou.
-
Tens medo de ir para a guerra? – Perguntei.
Ele
não respondeu, mas riu nervosamente:
-
Desculpa, é uma pergunta estúpida eu sei… - Admiti.
-
Não é. Acho que a maioria dos homens fica entusiasmado, eu também fico, de
certa forma, pela fama, glória e honra, mas a guerra não se define apenas pelas
vitórias e sucessos, também tem um lado negro, a morte, destruição, demasiadas perdas... – Disse,
dando um gole de cerveja como se atenuasse os maus pensamentos.
-
Perder aqueles que mais amamos numa guerra é a coisa mais estúpida que pode
acontecer…acho que não aguentaria perder mais ninguém.
-
Estás a falar do teu irmão, o Matthew?
E
mais um momento de silêncio, mas desta vez não devido a constrangimentos, mas
sim devido a lembranças dolorosa demais para recordar. Aquele era um assunto
delicado.
-
Sim, ele era meu irmão mas também era o meu melhor amigo, a pessoa que mais
admirava neste mundo. Quando ele morreu…parte de mim morreu com ele. Pensar que
posso passar pelo mesmo outra vez…
-
Não vamos pensar nisso agora, não vale a pena. – Tentou sossegar-me.
-
Tens razão.
Falar
sobre o Matthew era algo que eu simplesmente não fazia, trazia-me memórias
demasiado dolorosas, tinha sido um golpe muito duro para a minha família,
perder o herdeiro, o filho, o irmão. Tentava não pensar nele, ou
então escolhia não ter pensamentos tristes, lembrando-me dos bons momentos e da
pessoa maravilhosa que ele era.
Os
dias nessa semana passaram a correr. Tive definitivamente um pressentimento que
algo que estava para acontecer. Numa dessas tardes juntei-me á Beth e a Júlia
para ir á vila ver o mercado e os festejos. O James e o Richard juntaram-se a
nós, e levaram o Brandon para agradar a Júlia.
Eles
vinham atrás de nós a conversar sobre coisas que para mim não tinham interesse
nenhum, e nós íamos á frente vendo as barracas. Fui á tenda das flores
cumprimentar uma jovem com quem tinha travado amizade, uma jovem chamada Rina:
-
Lady Isabelle…
- Chama-me Belle, quantas vezes tenho de te dizer?
- Eu
sei La… - Interrompeu. - Belle, mas custa-me habituar.
-
Tens de conseguir. E a pestinha onde anda?
De
repente ouvi uma voz doce chamar por mim cheia de entusiasmo. Era a Lily, a
filha da Rina, correu para mim, para me abraçar:
-
Belle! Que saudades.
- Eu
sei, também tinha muitas saudades tuas, pestinha.
-
Tens de passar cá mais vezes.
-
Vou tentar.
- Tens mesmo de tentar. – Disse sorrindo.
-
Tens-te portado bem?
-
Sim.
-
Tens ajudado a tua mãe?
-
Sim, juro, em tudo o que me pede.
Olhei
para a Rina e ela confirmou, acenando.
-
Assim é que é, estás a tornar-te numa linda menina, cada vez mais linda. Bem,
tenho de ir, volto cá outro dia.
- Promete.
-
Prometo.
Despedi-me
delas e voltei para junto do grupo que esperava por mim. Eu não me importava de
fazer amizades fosse com quem fosse, fosse rico ou pobre. Já a Beth não era
assim, não por preconceito mas por não ser tão social.
- As
pessoas gostam de ti. – Apontou o James.
- E
eu gosto das pessoas, gosto de fazer amigos.
- É
uma coisa boa.
-
Porquê?
-
Porque és da família que governa a cidade, as pessoas sentem-se próximas de nós
através de ti.
-
Nem me preocupo com isso, nem me lembro, e as pessoas também não, simplesmente
simpatizam comigo.
- De
qualquer das formas, é bom saber. Talvez gostem mais de ti do que de mim, do
bastardo.
-
Não digas isso, és boa pessoa e preocupas-te. Às pessoas não lhes interessa de
onde vens ou quem és, desde que as respeites e trates como igual.
- És
muito sábia, para uma mulher tão jovem.
- Já
ouvi dizer que sim.
Continuámos
o nosso passeio. A cidade estava muito movimentada, havia o mercado e algumas
festividades. Perguntei-me se os guardas estavam a dar conta do recado.
Passámos pela banca das peles e reparei na jovem que lá estava, era muito
bonita e ficou muito contente por ver o James.
- Há
muito tempo que não passas por aqui, como tens passado? – Perguntou ela.
-
Não tenho muito tempo, e tu como vais?
-
Vou bem, mas podia estar melhor se arranjasses mais tempo para me visitares. – Disse,
muito á vontade, sem se importar com o resto das pessoas que ali estavam.
-
Esta é Belle, a minha noiva. – Revelou-lhe o James.
-
Olá. – Disse eu sem vontade nenhuma.
-
Esta é a Tara, uma amiga de infância. – Esclareceu-me ele.
- Já
tinha ouvido dizer, mas nunca pensei que fosse tão bonita, assim percebo porque
andas tão ocupado. – Respondeu ela com má cara.
Esperei,
sinceramente esperei, que aquilo não me fosse irritar, mas irritou. Começou a
irritar-me levemente a maneira como aquela rapariga falava tão abertamente com o James, mesmo
sabendo que estava noivo e mesmo comigo ali. Ele ficou a conversar com ela uns
minutos, enquanto isso cada um foi para o seu lado, esperando, e eu afastei-me também.
Capítulo revelador, este! O querido irmão de Belle que partiu, o terror de uma possível guerra... São coisas que dão profundidade a uma história e a faz ficar mais interessante, mais humana.
ResponderEliminarHumm, Tara. rumm. Quem é essa rapariga atrevida, heim! hehe
Não podia ficar só escrevendo sobre dramas amorosos, tinha de dar mais história, mais vida a esta trama. =D
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