sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Um Sonho Ou Realidade - Cap 22

Naquele momento, nunca me arrependi tanto de não ter fugido naquela noite, tinham-me irritado tanto aquelas insinuações, como se fosse capaz de fazer tal coisa. Não era esse tipo de pessoa, esse tipo de mulher e magoou-me que ele tivesse pensado que sim, por esta altura pensei que ele me conhecesse melhor.


Passei o dia fora e já sabia que, quando voltasse, teria de responder pelos meus actos, e que tinha deixado toda a gente preocupada, que uma Lady não se comportava assim, blá, blá, blá… a mesma conversa de sempre. Parece que já estava a ouvir o sermão do meu pai e o da minha mãe a fazer eco na minha cabeça.


Depois de algumas horas a cavalo, acabei por parar para descansar junto a um sítio lindíssimo, um lago na fronteira da floresta. Aquela zona, e praticamente todo o território que pertencia aos Hastings, era a norte do reino, e era frio, o Verão ali era como um final de Outono em Bruma. A água cristalina do lago, apesar de bela, era mortífera. Quem caísse naquela água e não fosse rápido o suficiente para se aquecer e secar, não sobreviveria. O lago em si, devido á baixa temperatura havia sido pouco explorado, era perigoso. 

Não estava a pensar em cometer nenhuma loucura, enchi a bolsa da água, deixei o cavalo descansar e matar a sede. Deixei-me lá ficar por um bocado enquanto afiei a minha espada, remendei algumas das minhas setas, dediquei algum tempo para pensar, reflectir sobre os últimos acontecimentos, e mais importante, tratei de me acalmar antes de voltar. Antes de seguir caminho passei a cara pela água fresca, para arrefecer toda a agitação que a noite anterior tinha causado. 

Olhei para o meu reflexo espelhado na água, e tive dificuldade em reconhecer aquela pessoa que olhava de volta. Vi o meu rosto cansado, abatido. Era isso que tinha ganho desde que chegara a Stormhold, preocupações e dramas. Não tinha aquela aura, aquele brilho que todas as noivas costumam ter, olhando para mim mesma, não consegui ver a jovem Belle despreocupada e com um sorriso no rosto, vi uma jovem mulher de olhos tristes e alma despedaçada.

Cheguei ao castelo antes do pôr-do-sol e tinha o meu pai e o Lord Hastings á minha espera:

- Onde estiveste Isabelle? - Perguntou o meu pai preocupado.

- Por ai, nada que não estejas habituado pai… - Disse com indiferença.

- Sim, mas não estás em casa, e estive aqui o dia todo á tua espera para me despedir. Eu, a tua mãe e a Marianne vamos voltar para Bruma. – Anunciou.

- Vão embora? Também posso ir? Não tenho de ficar aqui até ao casamento pois não?

- Tu e a Beth vão ficar… - Disse Hastings percebendo o meu aborrecimento – Não te preocupes que vamos tratar bem de vocês.

Ele deixou-nos, para me despedir dos meus pais em paz e com alguma privacidade. Agora que não havia mais ninguém por perto implorei á misericórdia do meu pai, ou á que eu pensava existir:

- Quero ir com vocês, não tenho de ficar aqui até ao casamento, por favor pai.

- Claro que tens de ficar Belle, és uma das noivas, tens de ficar e ajudar nos preparativos. – Respondeu ele.

- Acho que a Beth consegue fazer isso sozinha, sem problema nenhum. Eu volto, prometo, não estou a magicar nenhum plano de fuga.

- Belle… - Começou a minha mãe, num tom suave. – Neste momento é importante que estejas aqui, vais casar dentro de poucas semanas, não fica bem se fores embora, as pessoas vão pensar que não estás feliz. Vais ter oportunidade de voltar a Bruma depois disto tudo, não és prisioneira de Stormhold, podes visitar-nos sempre que quiseres.

- Não sou prisioneira, mas muitas das vezes, é assim que me sinto, e vou casar, não significa que esteja a explodir de contentamento.

Abracei o meu pai, a minha mãe e a Marianne e fiquei a vê-los partir, sem mim, até perder a carruagem de vista. Em seguida fui arrumar as minhas coisas e fui deixar a Storm no estábulo. Senti-me como um animal enjaulado, senti-me abandonada, tudo bem que a Beth ia ficar, mas além dela não tinha mais ninguém, teria de suportar o James sozinha. Tive um momento de fúria tão grande que agarrei na minha espada e desatei a cortar os fardos de palha. Serviu para acalmar as minhas frustrações, mas acabei por desistir, estava demasiado cansada.

- Já te acalmaste? – Perguntou o James saindo de um canto.

Não lhe respondi. Continuei a tratar da Storm até que ele se aproximou e pergunta:

- Não falas comigo?

- Não tenho de o fazer. Só tenho de esperar, casar e ter uma data de filhos… Para isso não tenho de falar! – Disse olhando-o com frieza.

Ele achou piada á minha irritação, mas eu não achei graça nenhuma.

- Achas engraçado?

- Um pouco, sim.

Aquilo ainda me irritou mais. Agarrei a minha espada e quando a apontei ele defendeu-se com a dele.

- O que estás a fazer? A tentar matar-me para não casares? – Provocou.

- Não me dês ideias James, sou bem capaz de o fazer se continuares a importunar-me.

Continuou a provocar-me. Tocou a na minha espada com a dele, como incentivo a continuar. Disparei alguns golpes que ele evitou sem problemas, mas depois começou a ficar sério, ele percebeu que eu não estava a brincar, e já teve algum trabalho em esquivar-se de mim.

- O que foi? Já não estás a achar piada? - Perguntei

- Não muita, para ser sincero. – Respondeu, um pouco ofegante já.

Eu era uma boa lutadora e não tinha problema em usar golpes sujos. Fiz-lhe uma rasteira que o apanhou desprevenido, caiu em cima dos fardos e apontei-lhe a espada ao pescoço. Tive oportunidade de acabar com o meu problema mas assim só iria desencadear uma guerra e acabar com a aliança entre as duas casas. Fitei-o seriamente e deixei cair a minha espada. Virei-lhe as costas mas ele levantou-se rapidamente e agarrou-me pelo braço:

- Perdoa-me pelo que disse ontem. Estava incomodado por estar no teu quarto e estarmos ambos…pouco apresentáveis. Tive problemas com uma situação parecida no passado.

Voltei-me para me ir embora, ignorando-o, mas ele agarrou-me de novo de maneira a encará-lo, de frente para ele, pelos braços.

- Não era minha intenção ofender-te Belle. Não quero que fiques assim comigo, por favor…

Soltei-me, fiquei no mesmo sítio e suspirei, fitando o chão.

- Está tudo bem… Acho que me deixei levar pelos problemas, acho que isto tudo me atingiu de repente, já esperava, sabia que não tardaria.

- Eu sei…

- Os meus pais vão embora, vão deixar-me aqui… - Disse sentindo as lágrimas a formarem-se nos olhos.

- Não vais estar sozinha, a tua irmã está aqui.

- A minha irmã está demasiado ocupada, demasiado apaixonada para se lembrar de mim!

- Eu estou aqui se precisares, sabes que sim.

Não encontrei resposta. Naquele momento trava uma batalha épica contra as minhas emoções e tentava evitar, com todas as minhas forças, que as lágrimas brotassem dos meus olhos. Acho que o James percebeu a minha agonia, puxou-me gentilmente para si e abraçou-me.

Não esperava tal gesto da parte dele, não depois do meu ataque de fúria. Ele sentou-se a meu lado no monte de palha e ficou ali comigo, não tivemos de dizer uma palavra, a sua presença foi o suficiente para me acalmar. Deitei-me nos fartos de palha, lembrei-me do ele tinha dito, acerca de uma situação do passado, e isso despertou a minha curiosidade.

- James, o que querias dizer quando mencionaste uma situação do passado?

Ele suspirou e fechou os olhos por instantes, como se fosse algo que ele preferisse não falar, mas que sabia que eventualmente eu iria fazer perguntas, acabou por responder, sem olhar para mim, deitando-se e fitando o tecto do estábulo:

- Há alguns anos atrás trabalhou aqui uma rapariga, estava cá desde pequena e crescemos juntos, apesar de ser uma empregada ela era sempre se deu connosco. – Ele fez uma pausa, não de propósito, mas porque talvez fosse doloroso de recordar. – Uma noite, ela apareceu no meu quarto, como tinha feito antes para conversar, mas eu estava cansado e ela foi embora. Ao sair do quarto, uma outra empregada viu-nos, viu ela a sair do meu quarto, ela de camisa de noite e eu só de calças. Era a dama de companhia de Lady Catherine.

Tive a impressão de que já sabia como ia acabar aquela história, mas deixei-o continuar.

- Algumas semanas depois, o irmão dela foi apanhado com esquemas ilegais, para não ser preso, o meu pai mandou-o embora e ela foi com ele. Passados alguns meses, ela volta, com uma barriga enorme, grávida e afirmando que eu era o pai. 

- O quê? - Perguntei indignada.

- Sim, podes imaginar a confusão que isso gerou, nem o meu próprio pai acreditou em mim, e eu estava pronto para ir embora de vez. Acho que a minha desgraça acabou por roer a consciência e ela acabou por confessar. Tinha sido tudo um plano do irmão, acho que a misericórdia que o meu pai mostrou não foi suficiente.

- E como ficaram as coisas com a tua família depois disso?

- Fiquei zangado e desiludido com o meu pai, não falei com ele durante algumas semanas, mas fiquei e acabei por perdoá-lo.

- Lamento imenso.

- Tinha tudo contra mim, e o facto de Lady Catherine ter, de certa forma, provas, não ajudou. Mas isso é passado, não guardo ressentimentos.

A vida de James não tinha sido nada fácil, imaginei. Ainda que fosse filho de um nobre, tinha sido sempre descriminado por não partilhar a mesma mãe, ele nunca se sentiu um verdadeiro Hastings, mas sim um bastardo. Certas pessoas fizeram questão que ele nunca se esquecesse disso. Com esta história consegui entender melhor o seu desejo de deixar Stormhold. Pressenti que isto não era uma coisa que ele contaria a qualquer pessoa, o facto de se ter aberto comigo agradou-me.

- O que pensam que estão a fazer? Não apareceram ao jantar. – Perguntou a Beth aparecendo do nada, num tom acusador e ao mesmo tempo com um sorriso travesso nos lábios.

2 comentários:

  1. Hummm. A gora entendi. Confesso que eu já julgava o James por não ter acreditado na Belle e ter sido tão rude. Mas agora sabemos que ele é traumatizado com o passado. Este capítulo foi interessante. Consegui empatia com os sentimentos da Belle. É terrível ser mau interpretado(a) desta maneira. Especialmente em termos sexuais.
    Vamos ver o que se desenrola no cap 23. #anxious!

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  2. Acho que o James nunca seria rude sem um bom motivo, não é da sua natureza ser assim. Tinha de haver mais qualquer coisa para ele se ter portado daquela forma com a Belle. Obrigado por acompanhar Jon. Bjs =)

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