Um Sonho Ou Realidade - Cap 16

O que estaria ele a tramar? Aqui estava mais um lado de James que eu desconhecia. O seu lado misterioso e o talento para engendrar, qualidades que aparentemente dominava bem.

- Estou aqui, humildemente perante vós, a minha família e os meus amigos, envergonhado. Aqueles que me são mais próximos sabiam dos meus planos para o futuro, alistar-me na King’s Guard, não guardei segredo acerca da minha vontade. E eu lamento profundamente todo o aparato e qualquer inconveniente que tenham causado. Nunca foi minha intenção ofender ninguém. – Disse olhando para mim e depois para o meu pai.

Lord Hastings estava inquieto no seu lugar e o meu pai estava igualmente preocupado. O meu coração batia tão rápido que duvidava que mais ninguém o ouvisse. A minha cabeça começou a funcionar, já a planear como iria fugir desta vez, visto que consegui imaginar o desfecho daquele discurso.

A sua vontade não me surpreendeu, muito pelo contrário. Eu teria feito a mesma coisa, ele sabia que eu ia compreender a sua rejeição. Nunca iria pensar menos de si por tomar aquela decisão.

No entanto, quando pensei que o James havia terminado, ele continuou a falar, para minha surpresa.

- Ainda assim, por respeito, acedi considerar uma segunda possibilidade. Portanto, sabendo que não irei arrepender-me da decisão relativamente ao meu futuro… - Fez uma pausa propositada. - Decidi, de bom grado, honrar a oferta de Lord Carvain. Só me arrependo de não ter percebido de inicio o quão generoso foi comigo, e sinto-me envergonhado por não ter aceitado logo. – Disse calmamente, olhando do meu pai, para mim.

O que raio tinha acontecido ali mesmo agora? Será que tinha ouvido correctamente? O James, contra todas as expectativas, tinha acabado de aceitar casar comigo? Porquê? O que teria acontecido para o levar a tomar essa decisão? Estava preparada para aceitar uma rejeição da sua parte, não uma aceitação.

Ele dirigiu-se a mim, fez uma vénia e esperou, mas eu estava pregada á cadeira, nem tive reacção, foi preciso a Beth dar-me uma cotovelada para me acordar do meu transe. Acabei por levantar-me, ainda em estado de choque, e dei-lhe a minha mão, que ele beijou carinhosamente. Depois disso, só me lembro das palmas e dos festejos que se seguiram. Estivemos sentados lado a lado o resto da noite, até terminar o banquete, e não trocámos uma palavra sequer. Nem sabia muito bem dizer o que estava a sentir, era um misto de sentimentos, demasiado confuso e intenso.

No final da noite, fui das primeiras pessoas a abandonar o salão, pedi licença e sai discretamente. Eu e o James tínhamos muito que conversar, sabia que não ia demorar muito até ele me encontrar. Então esperei pacientemente, num canto escuro do corredor que levava aos nossos aposentos, que ele passasse.

Não demorou nem dez minutos até que ele apareceu. Assim que passou por mim, emergi das sombras para o confrontar.

- O que raio estavas tu a pensar James, podes explicar-me? – Exigi saber.

- Belle… - Diz em sobressalto.

- Porque foste anunciar a tua decisão sem falar comigo antes? Porque não fizeste como combinámos? Fazes ideia do estado de nervos em que tenho estado o dia todo, á espera de um sinal teu? O que pretendes com isto tudo? O que te levou a aceitar? – Disse, deitando as perguntas todas cá para fora de uma vez.

- Porque, analisando bem as possibilidades, foi o que me pareceu melhor para nós os dois. – Respondeu com a maior das naturalidades.

- E quem te disse a ti que eu concordaria casar, mesmo que fosse contigo?

- Porque estás tão zangada? Se bem me lembro, todos os outros pretendentes estavam fora de questão. Pensei que juntos éramos capazes de ultrapassar isto.

- O que faz de ti melhor que os outros? Sei que existe uma ligação. – Disse apontando para mim e para ele. - Mas isso não significa que seja suficiente para casar. Estava á espera de uma rejeição, tu não querias casar e eu muito menos. Não podes ter simplesmente analisado as possibilidades e decidido que era o melhor.

Depois da minha explosão, os seus olhos escureceram, e ele pareceu-me um pouco irritado, frustrado e um tanto perdido. O James caminhou na minha direcção, encurralando-me entre ele e a parede, e falou-me seriamente, fitando-me, sem desviar o olhar:

- O que queres que diga? Olhei para o meu futuro, servindo na King’s Guard, e percebi que isso não significava liberdade, muito pelo contrário. Depois pensei, foi me oferecida a oportunidade de casar com uma mulher lindíssima, inteligente, carinhosa, e com quem até tenho uma ligação. Das duas opções, a segunda pareceu-me a melhor. Como me disseste, pensei no que me faria feliz e escolhi. Se não estás de acordo, podes continuar com o teu plano de fuga, sei bem que tens um. Não te irei impedir, e até arranjo forma de empatar. Mas, se quiseres ficar, vejo-te amanhã de manhã ao pequeno-almoço.

Terminou a sua longa e sincera justificação, olhou para mim, já mais calmo, com aquele olhar que derretia qualquer coração. Pegou numa madeixa do meu cabelo que se encontrava solta e prendeu-a atrás da minha orelha.

- E sim, o pensamento de te ver infeliz com outro homem, ou obrigada a deixares a tua família, e teres de passar o resto da vida em fuga, pesou na minha decisão. Não tinha como não pesar. – Disse, antes de me deixar sozinha no corredor.

 Ele nem me tinha deixado responder. Percebi que tinha acabado de magoar os seus sentimentos e que o tinha desiludido. Não percebi logo que as suas intenções eram as melhores e que além de tudo o resto, ele tinha considerado o meu bem-estar, mas no momento não consegui ultrapassar a minha irritação e ver o que ele tinha feito por nós. Agora sentia-me mal comigo própria, envergonhada até. Por vezes conseguimos ser umas verdadeiras bestas, cegas pela fúria. Só percebemos que agimos mal depois de o fazer, depois de pensar o que nem devíamos ter pensado, e dizer o que não devíamos ter dito.